O Espiritismo é uma tradição religiosa onde um conjunto de escritos tem também um papel importante e até de caráter fundamental. Estes escritos têm origem em Allan Kardec, pseudônimo adotado pelo cidadão francês Hippolyte León Denizard Rivail (1804-1869). Este pedagogo de um certo renome passa no ano de 1856 por uma experiência de comunicação que o atrai: ele conclui que se trata de comunicação de espíritos. Esta experiência vai influenciar e mudar toda a sua vida a partir de então: dedica-se a entender o que é esta comunicação e, sobretudo a escrever como ela funciona e o que ela comunica. Disto resulta a expressão muito conhecida no meio espírita, de que Allan Kardec foi o “codificador da doutrina espírita”. O que ele coloca por escrito não é entendido como mensagem ou revelação divina , nem tampouco como escritos puramente de sua autoria. A origem destes escritos estaria na comunicação dos espíritos, tendo sido Allan Kardec o meio pelo qual eles foram inicialmente compreendidos e postos num ordem escrita (daí codificação). Embora Kardec tenha escrito inúmeros textos, para a tradição religiosa a ênfase de sua produção recai sobre o chamado pentateuco espírita, quer dizer, os cinco principais tratados doutrinários, conhecidos também como Codificação Espírita. São eles, por ordem de publicação: O Livro dos Espíritos (1857), O Livro dos Médiuns (1861), O Evangelho segundo o Espiritismo (1864), O Céu e o Inferno ou a Justiça Divina segundo o Espiritismo (1865) e A gênese, os Milagres e as Predições segundo o Espiritismo (1868). Algumas destas obras conheceram diversas edições durante a vida de Kardec e ele as foi modificando com maior ou menor profundidade conforme entendia ser necessário. Comparando a escritos fundantes de outras tradições religiosas, os da tradição espírita são muito mais recentes e já surgidos no tempo em que se tem uma clareza muito maior da importância do autor e de seu contexto na obra. Entretanto se pode dizer que a tradição espírita acabou interpretando estes escritos cada vez mais como oriundos de “espíritos superiores”, dando a eles um caráter atemporal, como são vistos praticamente todos os escritos fundantes de religiões.
Volney J. Berkenbrock, O mundo religioso (Editora Vozes)